“Ganhando espaço autônomo, o trabalho pode arriscar-se no ambiente (…). Menos do que o risco de diluir-se no espaço, relevos suspensos no ar, o risco do trabalho é diluir seu conteúdo de verdade estético ao ficar aqui tão perto do sentimental. As “Gotas” assinalam, nesse sentido, a maturidade da linguagem de Maria-Carmen Perlingeiro ao assumir, no contexto problemático da arte contemporânea, sua parcela inerradicável de pureza — pureza formal, pureza afetiva. Destituídas de ironia, as “Gotas” (lágrimas) conservam apenas a margem indispensável de distância mimética. De resto, identificam-se formal e emocionalmente com o seu motivo. Claro, essas não são lágrimas de lamúria, nem as lágrimas amargas da raiva ou do rancor. São reações espontâneas, parte da química da vida, o avesso do sorriso.

Daí que sejam avulsas, a reaparecer aqui e ali, adaptáveis a diferentes lugares e situações. Lágrimas ocorrem de repente, a propósito de tudo e de nada, o amor e a morte, um quadro ou um filme. O que a série “Gotas” acata em definitivo, no conjunto da obra, é o registro puro do sentimento, um pouco na contramão do cinismo quase oficial que domina a cultura artística contemporânea.”

Ronaldo Brito