O título pode soar um tanto paradoxal, mas a paz precisa de luta. Não na base da porrada, tiroteio, ou bombas, mas na tenacidade, grandeza, e generosidade do espirito. Pois, enquanto a condição daquilo que é material é a constante divisão e eventual extinção, seja através de guerras, ou até mesmo doaçōes voluntárias, o espirito se multiplica, sempre que compartilhado.

A causa da paz é a causa da salvação do planeta, que ja não pode mais suportar a destruição de suas fontes naturais, consequente da competição pelo progresso, poder, e da ganância entre os próprios homens, que também se destroem, entre si. Como disse Xiuhzcat Martinez, o jovem ativista e apresentador na entrega dos prêmios da UNDP, a missão dessa luta, essa de quem, como ele, em suas próprias palavras, se apaixonou pelo mundo, não so é muito maior do que cada um de nós, como vai muito além de qualquer interesse político. Trata-se da herança do planeta em que moramos, e nossa responsabilidade de poder passar esse “lar” para as geraçōes futuras.

Os guerreiros da paz, que foram vencedores do prêmio equatorial, são aqueles que, de diversas partes do mundo, ( Brasil- com a associação Ashaninka Apewtxa, e a associação terra indígena Xingu- Indonésia, Guatemala, Kenia, Equador, Tailandia, Kazakhstan, Mali, Honduras, India, Pakistão e Belize) apresentam soluçōes locais para proteger, restaurar e lidar com a natureza de maneira que se possa atingir um desenvolvimento sustentável. O mundo tornou-se pequeno, e, para salva-lo temos que nos juntar, pois o separativismo de interesses, naçōes e credos já não encontra lugar, metafòrica e literalmente. Juntos numa mesma missão, poderemos, contra todas as possibilidades e previsōes apocalípticas, celebrar, então, o espírito humano.

Entre esses vencedores, estavam: Benki Pyiako e seu irmão Moisés Pyiako, líderes do povo Ashaninka, correspondentemente vice- presidente e presidente da aldeia Apewtxa, que obteve o prêmio pelo seu exemplo de sustentabilidade. Benki, que falou pela categoria dos povos indigenas, disse coisas que a presunção “civilizada” pensa entender, sem, porém, sentir, como ele, no coração: “Riqueza é poder beber água limpa e respirar ar fresco. Existe riqueza na fauna e flora da floresta; no equilíbrio entre os humanos e a natureza.”

Benki sente essas verdades no coraçāo, pois que, autentico guerreiro da paz, sabe oferecer o lado esquerdo do rosto, se o direito for agredido; desarmar, por acreditar. Encara a escuridão sem ver nela ameaça, e sim o principio da luz.

Lutam também pela paz, todos os nossos índios que, heróis, tudo enfrentam para espalhar sua mensagem, trazer a voz da floresta, e dar ao mundo o seu exemplo de fé e coragem, com extrema humildade . Aprenderam português como segunda língua, e conseguem enfrentar a constante estranheza de novas palavras em países continuamente estrangeiros, o frio físico e, pior, o gelo do confinamento das linhas retas, e o próprio desconhecido. O que deve ser pra eles tão “outro mundo”, quanto esse que nós, “civilizados”, chamamos de “outro mundo”, e que tão inexplicável, situamos depois da morte. Em sua extrema coragem e disciplina, os nativos encaram o que pra eles é “outro mundo”, com a grandeza de adota-lo, como parte do mesmo planeta. Pois, podem acreditar: quando se está na floresta, identificado ao respeito do modo de vida que eles levam, se sente na verdade, e o mundo civilizado é o que aparece absurdamente fictício, do “outro lado”, na sua mentalidade profana, e nas camadas do artifício que, ao invés de defesas de conforto e sobrevivência, são, antes de tudo, máscaras atrás das quais podemos nos esconder do nosso mêdo existencial.

Benki, como so aqueles que sentem a verdade com todo o seu ser, sabe falar com a mesma eloquência sobre conceitos ecológicos exatos, assim como sobre a esfera espiritual, em que as revelaçōes do Ayahuasca, sacramento da floresta, se entrelaçam com a realidade trivial, e revelam o caminho de identificação com a consciência cósmica: o caminho desinteressado, altruísta, e realmente salvador .